Para melhores condições remuneratórias no sector da conservação e restauro

Os inquéritos realizados pela Associação Profissional de Conservadores-restauradores de Portugal (ARP), nos anos de 2020 e 2022 (centrados na caracterização do sector da conservação e restauro em Portugal, nos impactos produzidos pela Pandemia no mesmo, e sobre as condições de emprego e empregabilidade na área), vieram trazer todo um conjunto de dados estatísticos que contribuíram para um maior e mais actualizado conhecimento sobre este sector e materializar, em números, várias das fragilidades desta área profissional, há muito percepcionadas pelos conservadores-restauradores e conservadoras-restauradoras no seu dia-a-dia.

Um desses aspectos, prende-se com o baixo nível remuneratório auferido pelos profissionais, manifestamente desajustado relativamente à formação que possuem e que contribuem (ainda que não de uma forma exclusiva), para uma elevada taxa de abandono da profissão.

Voltando aos números presentes nos inquéritos, e considerando os conservadores-restauradores e conservadoras-restauradoras que desenvolvem a sua actividade no sector privado (que absorve 80% dos profissionais), 62% em regime de trabalho por conta de outrem auferem entre 7 621,00€ e 12 500,00€ líquidos por ano, com apenas 34% a auferir acima de 12 500,00€; já no caso dos trabalhadores independentes, 21% auferem até 7 620,00€ por ano, 54% entre 7 621,00€ e 12 500,00€, sendo que apenas 26% auferem mais de 12 500,00€ por ano.

Apesar de existirem vários factores que contribuem para o abandono e precaridade na profissão (tais como vínculos laborais precários, a ausência de critérios de adjudicação adequados no âmbito da contratação pública, a não regulamentação da profissão, a carga fiscal excessiva aplicada às empresas e aos trabalhadores) e da sua resolução se revelar complexa, as remunerações assumem uma importância central nesse contexto, uma vez que remetem para a valorização e reconhecimento do trabalho especializado realizado por estes profissionais, e por terem um impacto significativo no bem-estar e na sua qualidade de vida.

É por isso que a Associação Profissional de Conservadores-restauradores, e aproveitando o simbolismo da data de hoje (01 de Maio), decide manifestar a sua preocupação relativamente a esta matéria, e lançar um repto às empresas do sector, para que se possa começa a trilhar um caminho que permita inverter esta situação.

Propomos que possa vir a ser estabelecido, de uma forma concertada, um valor mínimo remuneratório para todos os profissionais que se encontram no mercado (e enquadrados no perfil definido pela ARP) e que seja, numa primeira fase, nunca inferior ao valor correspondente à posição 1 da tabela remuneratória aplicada na função pública para os técnicos superiores – reflectindo as diferenciações existentes ao nível da fiscalidade, entre trabalhadores por conta de outrem e trabalhadores independentes.

São vários os exemplos de iniciativas similares noutros sectores económicos, como seja o acordo realizado em 2021 pela Associação de Empresas de Construção e Obras Públicas e Serviços com outras estruturas do sector (onde foram definidas as tabelas salariais para as diferentes categorias profissionais), ou mais recentemente o pacto “Mais e Melhores Empregos para os Jovens”, que contou com adesão de 50 das maiores empresas portuguesas – e onde foi assumido o compromisso de pagamento de salários de valor mínimo equivalente ao nível remuneratório correspondente à entrada na carreira geral de técnico superior, aos jovens com ensino superior.

É possível ambicionar este passo no sector da conservação e restauro, com estas iniciativas a mostrarem que os interesses da economia e das empresas não se dissociam da necessidade de regulação e valorização das condições remuneratórias dos trabalhadores e trabalhadoras – revelam também que existe a consciência geral no sector empresarial que o investimento na valorização remuneratória e profissional dos trabalhadores produz um retorno para as empresas.

Quando existe um compromisso assumido pelo actual governo, e subscrito pelas confederações patronais (da Indústria, da Agricultura, do Turismo e do Comércio e Serviços) e sindical (UGT), para um aumento de cerca de 20% do rendimento médio por trabalhador entre 2022 e 2026 (devido ao empobrecimento que se vem registando nos últimos anos), não podemos passar ao lado desta discussão e continuar a ignorar este problema, sob pena de no médio prazo, não termos profissionais qualificados em número suficiente e com a experiência necessária, para intervir na salvaguarda do património cultural.

Convidamos as várias empresas a associarem-se a este movimento, deixando a ARP a sua disponibilidade para acolher um primeiro encontro informal onde se possa dar início a este processo de discussão e entendimento.